Contratada por R$ 120 mil pela prefeitura comandada pelo primo do marido, a advogada Roberta Gomes Cunha Lima é funcionária do gabinete do deputado Ruy Carneiro (Pode-PB). A propriedade da empresa contratada sem licitação pela prefeitura do primo revela que ela burlou as regras da Câmara que impede assessores parlamentares de “serem proprietários de firma individual” ou ser sócio de empresa de qualquer porte. Roberta abriu uma empresa individual de advocacia em julho de 2020.
Há ainda exigência do cumprimento de 40 horas semanais de trabalho como “secretária parlamentar”, cargo ocupado por Roberta, que informou ao Estadão não registrar os horários.
“Eu trabalho de acordo com o que a demanda requer. Sejam 4, 8, 12, 40, 60 (horas), não importa. E não preciso ‘bater ponto’. Esse eu faço no travesseiro, que pouco me encontra e quando encontra, é no sossego da consciência tranquila”, afirmou quando questionada pela reportagem sobre que horas trabalha para o deputado.
O parlamentar também afirmou que Roberta é atuante no serviço que presta na Paraíba desde 2019, mas não soube explicar como a manteve no cargo mesmo com impedimento de conciliar o cargo com uma empresa em nome dela. (Veja mais abaixo)
Na quarta-feira, dia 1º, o Estadão revelou que Roberta Gomes Cunha Lima teve sua empresa contratada sem licitação pela Prefeitura de Campina Grande para serviço de consultoria no valor de R$ 121 mil. Roberta é casada com o secretário de Cultura da cidade, Ronaldo Cunha Lima Filho, primo do prefeito Bruno Cunha Lima (PSD).
De acordo com o Diário Oficial da Paraíba, o serviço prestado é de treinamentos “técnico jurídico especializado de consultoria” para servidores que atuam no setor de mobilidade urbana do município. Roberta afirmou que o trabalho contratado é para ensinamentos sobre a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), uma legislação em vigor há cinco anos.
O site oficial da Câmara dos Deputados afirma que o cargo ocupado por Roberta no Poder Legislativo pode ser exercido em Brasília ou no Estado político do parlamentar. No entanto, aponta situações que impedem a nomeação do servidor. Entre elas, ser “proprietário de firma individual” ou gerente e administrador de empresas de qualquer tipo.
Abertura de empresa ocorreu depois de nomeação na Câmara
Os dados disponíveis no site do Poder Legislativo mostram que Roberta começou a atuar como secretária parlamentar em fevereiro de 2019. A empresa Roberta Gomes Sociedade Individual de Advocacia foi aberta em 2020. Para posse na Câmara, o servidor deve declarar não ter vínculos fora do Poder Legislativo.
“Eu não tenho impedimento de assumir o cargo como secretária parlamentar até porque não presto o serviço jurídico para ele. Assim sendo, para que fique mais claro: Roberta (CPF) é secretária parlamentar e não jurídica do deputado Ruy. Roberta Gomes Advocacia (CNPJ) presta consultoria jurídica. Serviços totalmente diferentes e sem impeditivo legal”, afirmou a advogada ao tentar se defender.
Na Paraíba, Roberta ainda é presidente a Comissão de Privacidade e Proteção de Dados da OAB/PB e professora de pós-graduação.
Deputado diz não ter ‘controle’ sobre informações
“Ela fica na Paraíba. É minha assessora há um bom tempo e trata de diversos assuntos para mim em João Pessoa, onde moro e é minha base política. A atuação dela comigo não é jurídica, é de assessora. Ela não atua como minha advogada. Meus advogados são outros”, afirmou o deputado.
Sobre a funcionária ter uma empresa, ele disse: “isso aí é na hora de a pessoa nomeada eles fazem essas perguntas e tal. Isso aí eu não tenho controle disso. O que estou lhe dizendo apenas é que ela é de João Pessoa, trabalha pra mim, exerce o cargo, sempre foi minha assessora e o trabalho que ela faz pra mim não é jurídico, é um trabalho geral.”
Apesar de o deputado afirmar que ela atua em João Pessoa e o contrato de consultoria que ela firmou com a prefeitura do seu primo por afinidade ser em Campina Grande, uma distância de quase quatro horas entre ida e retorno, Roberta não respondeu ao Estadão em quais cidades e locais atua como assessora parlamentar.
“Se eu não tenho reclamação do meu chefe, Ruy Carneiro, nem dos contratantes da ‘OAB’, acredito que está tudo bem alinhado, cumprido e devidamente atendido”, concluiu.
A assessoria de imprensa da Câmara dos Deputados afirmou que o cumprimento de 40 horas semanais “é de responsabilidade do parlamentar, que encaminha, mensalmente, por meio eletrônico, comunicado de frequência dos servidores do seu gabinete”.
O Estadão questionou se um secretário parlamentar pode ter escritório de advocacia ao mesmo tempo que exerce a função no Poder Legislativo. A assessoria enviou link com impedimentos para ocupar a função, entre eles, “ser proprietário(a) de firma individual”.
- O Estadão